Exposições
Cidade de Protesto
Cidade de Protesto é um conjunto de imagens capturadas em diversas manifestações que decorreram na cidade do Porto desde o dia 10 de março de 2024.
Autoria / Curadoria: Luísa Fernandes é uma artista portuguesa, nascida na cidade do Porto em 1996. Tirou o Curso de Fotografia no Instituto Português de Fotografia do Porto, e um Mestrado em Fotografia na Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa. A sua primeira exposição a solo decorreu na Livraria Aberta, no Porto, em maio de 2024.
“Quando olho nos olhos da Luísa há muita irreverência que transparece logo num primeiro instante, uma frontalidade que a voz dela não segura. O franzido da sobrancelha que acompanha o seu discurso verbal é comparável ao seu sorriso por detrás do corpo da câmara. Quando observade pelas lentes da Luísa, a sensação que tenho é que não poderia estar tão despide de qualquer construção social. Olhar-me através das suas fotografias é a forma mais crua que alguma vez poderia imaginar – não é fácil olhar-me, mas ela vê-me e representa-me tal qual sou, tal qual sinto no exato momento do clique.” (C.Costa)
Em novembro, é de abril que me lembro
Há 50 anos, já tinha caído o governo fascista. Fizeram-se manifestações, reuniões, assembleias, greves, escreveram-se muitos panfletos e poemas, pintaram-se muitas paredes da raiva e do desejo mais íntimo de liberdade. O ano de 2024 foi marcado pelas muitas histórias das pessoas que fizeram a Revolução. Durante o ano, muitos cravos desfilaram nas lapelas, inspiraram novas canções, foram pintados de fresco em muros de escolas, juntaram milhares de pessoas em protestos pelo direito à habitação, nas manifestações contra as frentes fascistas e racistas portuguesas, nas marchas feministas e LGBTQIA+. A convite da comissão organizadora do IX Congresso Internacional em Estudos Culturais, Culturas, ativismos e mudanças culturais, organizamos esta exposição coletiva, juntando amigas, amigos e amigues para contar uma história. Em 2022, ocupamos três pisos da Galeria Geraldes da Silva no Porto, com A Festival, propondo um encontro entre artistas, coletivos e associações, para celebrar a Existência, a Transgressão e a Luta. A luta que se faz no encontro é a que nos permite imaginar a possibilidade de existir na transgressão à norma racista, patriarcal, capitalista e colonial. Trazemos as histórias de luta de associações e coletivos que fazem parte da nossa história contemporânea. A história que vos trazemos fala do abril que começou há 50 anos atrás e que um novembro quis interromper… mas não conseguiu calar-nos. Ainda estamos aqui porque somos as Marias que vão umas com as outras, às vezes no solavanco da resistência à mudança e à transformação social. Somos as netas das Marias que fizeram a revolução.
Autoria / Curadoria: Feminismos Sobre Rodas. O Feminismos Sobre Rodas é um coletivo e uma associação sem fins lucrativos,que surge em 2019 com o projeto da Rota Feminista. Entre o Douro e o Minho, o coletivo tem desenvolvido diversas iniciativas de intervenção política no espaço público em diferentes zonas do norte de Portugal, numa perspertiva de construção de redes de afinidade com associações feministas, comunidades migrantes, coletivos e movimentos LGBTQIA+, pelo direito à habitação e antirracistas, movimentos de trabalhadoras/es do sexo, entre outros.
Narrativas de Resistência
Este projeto faz parte de um livro com narrativas de resistência de pessoas que são uma referência para comunidades minoritárias da sociedade civil, colocando-as em diálogo com as perspetivas de investigadores académicos, cujas teorias tentam compreender estas vivências. Relatos da sociedade civil para a academia e da academia para a sociedade civil, que pretendem contrariar a ideia de que a academia é um circuito fechado que não se relaciona com a sociedade civil e de que tem dificuldades em transmitir conhecimento de um modo simples e percetível para toda a sociedade.
Autoria / Curadoria: Rosalina Silva descobriu a sua paixão pelo desenho durante a pandemia. Utilizando a arte como uma forma terapêutica, encontrou no desenho um escape à dura realidade do mundo, enquanto procurava a sua identidade artística. Ainda sem um estilo definido, o seu interesse centra-se na representação de rostos, corpos, elementos da natureza e nas banalidades do quotidiano, temas que se tornaram recorrentes no seu trabalho. Rosalina dedica-se à observação das pessoas, representando-as através de linhas soltas e sem planeamento prévio.Com um percurso que inclui a música e o teatro, está a finalizar o último ano do mestrado em Ciência da Informação, onde pretende continuar a explorar o mundo da investigação, unindo a sua paixão pelas artes ao seu percurso académico.
Cristiania: Cidade livre domesticada
“You are now entering the European Union” é a mensagem com que nos deparamos quando saímos do espaço que se intitula “Cidade Livre de Christiania” e que se situa no centro de Copenhaga, na Dinamarca. Este espaço, de 34 hectares, localizado próximo das áreas mais conhecidas e turísticas da cidade, transforma-se nesta cidade livre, nos anos 70, quando algumas famílias (cerca de trinta pessoas) de Copenhaga, inspiradas pelos valores da revolução cultural dos anos sessenta, decidiram ocupar uma zona do bairro de Christianshavn que tinha sido abandonada pelos militares. Atualmente vivem lá cerca de mil pessoas e continuam a reivindicar este espaço como uma cidade livre e independente da Dinamarca e da União Europeia. Efetivamente Christiania é caracterizada por um sistema de autogestão e governação coletiva e a comunidade é regida por uma estrutura de democracia direta, onde todas as decisões importantes são tomadas por consenso em reuniões temáticas. Essa forma de governança permite uma gestão participativa e horizontal, sem a presença de uma autoridade central ou polícia formal provindos da comunidade.
A economia de Christiania é baseada numa combinação de trabalho coletivo e contribuições individuais: a comunidade trabalha em diversos serviços sociais, como assistência médica, correios locais, creches, atividades culturais, bares, restaurantes, lojas e pequenos negócios, como oficinas de bicicletas e fabricação de móveis dentro do espaço da Christiania, mas também existem muitos residentes que trabalham fora da comunidade, em Copenhaga. Até há algum tempo, uma das atividades económicas mais rentáveis era a venda de drogas leves, especialmente cannabis, permitida na Pusher Street, onde apenas os residentes de Christiania poderiam vender. No entanto, atualmente, essa rua fechou. Por toda a sua forma de organização, é indiscutível que Christiania representa uma alternativa significativa ao capitalismo neoliberal e às visões normativas de criatividade urbana. A sua existência pode servir de exemplo de como a autogestão e a economia local baseada na comunidade podem suster um ambiente criativo e sustentável.
Apresentamos, no entanto, neste trabalho, algumas fotografias que demonstram que a cidade livre foi domesticada, porque foi sendo gradualmente absorvida, neutralizada e incorporada pelas estruturas institucionais e pelo sistema dominante. A cidade livre, inicialmente tão radical e contestatária, que, por exemplo, rejeitava ter um sistema policial, foi invadida pela polícia de Copenhaga, que faz rondas por este espaço mais vezes do que por outra zona da cidade, transformando a essência da cidade, diluindo o seu potencial disruptivo e transformador para acomodar as normas e expectativas do status quo. As cinco fotografias que aqui apresentamos, tiradas em Christiania, no mês de maio de 2024, mostram como este espaço foi moldado para se conformar às normas e regras estabelecidas pela cidade de Copenhaga e de como a sua cultura foi ajustada para ser mais apelativa e menos ameaçadora para as estruturas de poder existentes. O elemento mais radical e contestatário – a Pusher Street – foi removida, demonstrando moderação, aceitação de compromissos e a adoção de táticas menos confrontadoras. Esta domesticação, que implicou cooptação e, de algum modo, alguma integração, levou a mudanças concretas e tangíveis, por exemplo, à transmissão de segurança aos tantos turistas (como eu) que por lá se passeiam a tirar fotografias como estas que se apresentam aqui, mas será que isso não compromete os princípios fundamentais da “cidade livre”?
Autoria / Curadoria: Helena Ferreira é doutoranda do programa doutoral em Estudos Culturais da Universidade de Aveiro e membro do Grupo Entre Culturas – Hermenêuticas Culturais, no Projeto Género e Performance do Centro de Línguas, Literaturas e Culturas da mesma Universidade. Publicações recentes relacionam-se com as seguintes temáticas: questões de género no teatro, feminismo, teoria queer, semiótica e direitos humanos.